Esta atividade de Língua Portuguesa tem como base o DC/GO – Ampliado e está destinada a estudantes do 8º ano do Ensino Fundamental. A função social do conto

A função social do conto
O conto é um gênero narrativo que nasceu e se popularizou no domínio oral e, com a expansão da língua escrita e dos mecanismos de publicação, alcançou um lugar cativo no mercado editorial. Caracterizado por ser uma narrativa curta, com poucos personagens, espaço e tempo reduzidos e um enredo concentrado em um único conflito, o conto alcança várias formas de composição. Há contos centrados no terror, no mistério e suspense, na aventura, no humor, na fantasia – ao misturar elementos naturais e sobrenaturais – e até mesmo no psicológico humano.
Além de entreter, o conto cumpre uma função social importante: provocar reflexões sobre valores, comportamentos e questões sociais. Por meio de uma narrativa planejada, o conto pode abordar temas como desigualdade social, preconceito, violência, ética, amor, entre outros aspectos da condição humana. Assim, esse gênero pode contribuir para a formação crítica do leitor, levando-o a questionar e, possivelmente, transformar sua realidade.
Você já se perguntou como o conto pode alcançar e transformar a sociedade? Muitos contos representam a realidade ao retratar aspectos da vida cotidiana, dando visibilidade a problemas sociais que nem sempre são debatidos abertamente. Com isso, ao apresentar dilemas e conflitos humanos, o gênero literário conto pode estimular o leitor a refletir sobre suas atitudes e questionar as estruturas sociais das quais participa.
Outra contribuição importante para a sociedade advinda do conto é seu poder de valorização da cultura, das tradições, dos modos de falar e das experiências coletivas de um povo. Mas, também, de inspirar empatia e transformações dentro dessa cultura. Assim, ao mesmo tempo que diverte, o conto é um instrumento pedagógico e social que contribui para a transformação das mentalidades e da sociedade.
Assista à videoaula do professor Marlon Santos com essa temática.
Responda às questões a seguir.
Leia o conto a seguir para responder às questões.
Me responda, sargento
Dez anos, sargento, apartada de João. Uma tarde, sem se despedir, montou um cavalinho pampa. Em dez anos de espera nunca deu uma notícia. Com a morte do meu velho, que me deixou o sítio, quinze dias atrás lá estava eu, bem quieta, cuidando da casa e da criação, ajudada pelo meu afilhado José, esse anjo de oito aninhos. Quem vi entrando sem bater palma nem pedir licença? Chegou maltrapilho, chapéu na mão, me rogou para fazer vida comigo. Mais de espanto que saudade aceitei, bom ou mau, eu disse, é o meu João.
Nos primeiros dias foi bonzinho. Quem não gosta de uma cabeça de homem no travesseiro? Logo começou a beber, não me valia em nada no sítio. Eu saía bem cedo com o menino a lidar na roça, o bichão ficava dormindo. Bocejando de chinelo e desfrutando as regalias. Não quer castigar o corpinho, um punhado de milho não joga para as galinhas. Só então, sargento, burra de mim, descobri o mistério: ele voltou por amor da herança. Na primeira semana vendeu o leitão mais gordo do chiqueiro, não me deu satisfação. O sargento viu algum dinheiro? Nem eu.
Ontem chegou bêbado e de óculos escuro. Espantou o menino para o terreiro e, fechados no quarto, bradou que eu tinha um amante, o meu afilhado bem que era filho e, antes de contar até três, eu dissesse o nome do pai. Por mais que, de joelho e mão posta, negasse que havia outro homem, por mim o testemunho dos vizinhos, ele me cobriu de palavrão, murro, pontapé. Pegou da espingarda, me bateu com a coronha na cabeça. Obrigou a rezar na hora da morte e pedir louvado. Que eu abrisse a boca, encostou o cano, fez que apertava o gatilho. Não satisfeito, sacou da garrucha, apagou o lampião a bala. Disparou dois tiros na minha direção, só não acertou porque me desviei. Uma bala se enterrou na porta, a outra furou a cortina, em três pedaços a cabeça de São Jorge.
Cansado de reinar, deitou-se vestido e de sapato. Que a escrava servisse a janta na cama. Provou uma garfada e atirou o prato, manchando de feijão toda a parede: “Quero outra, esta não prestou.” Deus me acudiu, ao voltar com a bandeja ele roncava, espumando pelo dente de ouro. Agarrei meu filho, chorando e rezando corri a noite inteira, ficasse lá no sítio era dona morta. E agora, sargento, que vai ser da minha vida? Que é que eu faço?
TREVISAN, Dalton. Vozes do retrato. São Paulo: Ática, 1991. p. 47.
QUESTÃO 1
Considere as seguintes afirmativas sobre a estrutura e a linguagem do conto:
I. O conto apresenta uma narrativa em primeira pessoa, com linguagem oral, marcada pela fala direta da personagem principal, que se dirige ao sargento buscando proteção e orientação.
II. A estrutura do conto é linear, com começo, meio e fim claros: a volta do marido, a violência crescente e a fuga desesperada.
III. A linguagem é marcada por elementos típicos da oralidade: frases curtas, interjeições, expressões regionais e um tom confessional.
IV. A linguagem oralizada presente no conto afasta a narradora e o leitor, pois não transmite as emoções da personagem.
Sobre as afirmativas acimas, estão corretas apenas
(A) I, II e III.
(B) I, II e IV.
(C) I, III e IV.
(D) II, III e IV.
QUESTÃO 2
A principal temática abordada no conto é a
(A) saudade de um amor do passado que voltou.
(B) violência doméstica e a opressão de gênero.
(C) alegria de uma mulher pelo retorno do marido.
(D) infância e a proteção familiar no interior do país.
QUESTÃO 3
A narradora decide fugir de casa porque
(A) quer buscar novas oportunidades na cidade.
(B) José, seu afilhado, pediu para morar em outro lugar.
(C) seu marido a agrediu fisicamente e ameaçou sua vida.
(D) está arrependida de ter aceitado João de volta.
QUESTÃO 4
A figura do sargento, para quem a narradora se dirige, representa
(A) um amigo íntimo, que vai acolhê-la em seu apartamento.
(B) um desconhecido, para quem ela conta sua história pessoal.
(C) a autoridade, a quem pede proteção frente à violência sofrida.
(D) o marido violento, que mudou de profissão depois de anos fora.
QUESTÃO 5
A narrativa é estruturada a partir de
(A) um relato objetivo, feito por um narrador onisciente.
(B) uma conversa entre a narradora e seu afilhado.
(C) um depoimento oral para uma autoridade policial.
(D) uma carta anônima enviada para a polícia local.
QUESTÃO 6
O conto de Dalton Trevisan faz uma denúncia social muito importante. Que denúncia é essa?
QUESTÃO 7
A narrativa termina com a protagonista fazendo um questionamento ao sargento. Sabendo que a referência bibliográfica do texto é datada de 1991, e refletindo sobre a função social do conto, diga quais medidas poderiam ser tomadas para resolver o problema da personagem?
QUESTÃO 8
Você acha que um texto como esse pode ajudar os leitores a refletirem sobre a realidade social das mulheres no Brasil? Justifique sua resposta com base na leitura.
Autoria: | Marlon Santos |
Formação: | Letras – Português |
Componente curricular: | Língua Portuguesa |
Conteúdo(s)/Objeto(s) de conhecimento | Autoria, contexto social e histórico em textos literários; Posicionamento crítico sobre textos. |
Habilidade estruturante: | (EF69LP44-B) Reconhecer, em textos literários, formas de estabelecer múltiplos olhares sobre as identidades, sociedades e culturas, considerando a autoria e o contexto social e histórico de sua produção. |
Descritores: | D4 – Inferir uma informação implícita em um texto. D6 -Identificar o tema do texto. |
Referências: | Documento Curricular para Goiás (DC-GO). Goiânia/GO: CONSED/ UNDIME Goiás, 2018. Disponível em: <https://cee.go.gov.br> Acesso em: 03, fev. 2025 TREVISAN, Dalton. Vozes do retrato. São Paulo: Ática, 1991. p. 47. |